28/04/2008

As teorias e o Jornalismo OnLine

"Enfim, o jornalismo mudou.
A constatação talvez possa parecer óbvia demais,
porém se o jornalismo mudou com a Internet
quanto não terá mudado o jornalista?"


(Ana Paula Rosa: Jornalista na Web: Fundamental ou Dispensável?)



Revisitando a teoria do "gatekeeping"

Sem uma teoria própria, o Jornalismo OnLine vem reciclando paradigmas do Jornalismo tradicional, e revisando conceitos, ora aplicados aos novos suportes tecnológicos e novas formas de produção de conteúdo.

Exemplo disso é o ressurgimento das discussões acerca da "teoria da ação pessoal", ou Gatekeeper, segundo a qual "as notícias resultam da seleção de acontecimentos com base nas opções particulares de cada jornalista seletor" (SOUSA, Jorge Pedro).

Em outras palavras, de acordo com essa lógica que vigorou com força durante as décadas de 40 e 50 do século passado - e diga-se de passagem inspirou clássicas HQ´s como o Homem Aranha e Superman -, o próprio dono do jornal centralizava as decisões editoriais do veículo de comunicação.

Metaforicamente chamado de "gatekeeper", ou "guardião do portal", cabia a ele a seleção das notícias que seriam publicadas. As escolhas, claro, eram feitas segundo seus próprios interesses, e nada tinham a ver com o interesse público.

Cabe destacar que, qualquer tipo de escolha editorial, arbitrária ou segundo lógicas modernas, que apesar de ainda - ou mais do que nunca - terem a obrigação de responder a interesses particulares - são mais voltadas aos interesses do consumidor/público - ora considerado pensante - condiciona não apenas o que o receptor irá ler, mas também o tipo de leitura que ele fará (direciona a interpretação).


Quem são os novos gatekeepers?

Pode-se dizer que a grande diferença, no entanto, entre o velho e o novo paradigma do gatekeeping é que, apesar dos veículos jornalismo da web (considerando inclusive, e principalmente os blogs) estarem voltando a serem individualistas editorialmente - de modo que a "chave de cada portal" continua tendo poucas cópias distribuídas nas mãos de poucos, ou de um só - hoje em dia, com o advento da Internet, existem muitos portais e muitos formadores de opinião, não ficando mais os leitores, agora também internautas, limitados a um ou dois veículos de imprensa concorrentes.

Diante da possibilidade de uma leitura multilinear, e da interatividade proporcionada pela Internet, o potencial de crítica - e de escolha interpretativa - dos leitores é incomparavelmente maior. Têm-se acesso direto às fontes primárias, além da possibilidade de cruzar informações e "checá-las" em outros veículos de comunicação (jornais, sites, blogs...), criticá-las e até corrigí-las, correção esta que pode ter repercussão igual ou maior em relação ao conteúdo gerado originalmente.

Sobre isso, duas observações: primeiro, é possível - e o jornalismo on line já vivenciou exemplos disso - que vários veículos tidos como passíveis de credibilidade publicarem erradamente uma informação. Erros, na Internet são comuns tanto pela ação tirana do tempo (vive-se num constante dead line) quanto pela própria concepção de uma rede de informações colaborativa, passível de ser atingida por conteúdos falsos. Segundo, é certo que ninguém tem muito tempo para ficar checando informações em vários sites de notícias, e por isso, vai escolher um, ou alguns, de sua preferência para executar a filtragem desse enorme fluxo de informações.

Por isso, para Jorge Pedro Sousa, a função do gatekeeper é fortalecida no âmbito do Jornalismo on line: "No dia-a-dia as pessoas continuam a preferir, e eu diria até a necessitar, da informação seleccionada, avaliada, hierarquizada, organizada e muitas vezes com uma mais valia de análise e de opinião que lhes é oferecida pelos jornalistas e pelos meios jornalísticos. Por isso, a concorrência entre provedores de informação na Internet contribui para modificar o jornalismo, mas também é a sua garantia de sobrevivência e de crescente qualidade." (SOUSA, Jorge Pedro)


Teoria em discussão

No artigo em que traça um paralelo entre as teorias do "newsmaking" e o atual processo de construção das notícias, a jornalista Ana Paula Rosa avalia que "o jornalista, ao que tudo indica, diante do ciberespaço e das informações disponíveis na rede tem uma tarefa árdua a realizar, pois o seu caráter de "filtro" da informação continua valendo, talvez até mais. Na web a necessidade de oferecer a informação mais importante e de forma ágil faz com que o jornalista seja imprescindível, já que o leitor-internauta dificilmente buscará um jornal online se não tiver a notícia que deseja ao alcance de alguns poucos cliques". Segundo ela, o fato de que um texto dos jornais online só deva ser publicado depois de editado já configura uma função do gatekeeper.

Entre os autores que acreditam na perenidade do valor da função jornalística, Doug Millison (1999) analisa que "uma edição e filtragem de informação de confiança e com qualidade torna-se ainda mais importante na Internet, onde qualquer pessoa pode publicar qualquer coisa e fazer com que pareça importante. Em vez de encontrar ou descobrir informação, a tarefa agora é seleccionar, na amálgama informativa disponível, a informação mais importante". (HERBERT, 2000, in AROSO, Inês).

Há quem defenda, no entanto, que o papel de gatekeeper do jornalista acabou.
Para Inês Aroso, o jornalismo está sendo reinventado na web. A pesquisadora cita Jim Hall que, ao contrário do dito anteriormente, acredita que a função de gatekeeper se extinguiu com o advento da Internet, uma vez que as fontes primárias estão acessíveis às audiências, ou seja, aos usuários da rede, sendo que os próprios leitores-internautas se transformaram em contadores de histórias, antes papel exclusivo do jornalismo. (in ROSA, Ana Paula)

Ainda segundo Ana Paula Rosa, a maioria dos pesquisadores, porém, ainda defende a função de gatekeeper do jornalista, visto que a tarefa é selecionar, escolher dentro de toda a gama de dados disponíveis aquilo que parece ser o mais importante. "Na verdade, o que se descortina diante dos olhos é uma reconquista da função do gatekeeper, ou melhor um reforço desta idéia, pois o jornalista poderá ter as chaves que guardam as informações credíveis e úteis."

Inês Aroso também reforça a mesma tese, e ainda acrescenta a questão da retomada da importância não apenas do papel seletivo, mas também interpretativo, sobre as notícias no jornalismo on line ao afirmar que "com o jornalismo on line ocorre uma revalorização da mediação do jornalista. Saber explicar e dar uma interpretação dos acontecimentos será algo cada vez mais valorizado".


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A Internet e os novos papéis do jornalista e do cidadão
Por que as notícias são como são?

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